As mulheres do meu Avô
O meu Avô – chamemos-lhe assim que é o nome pelo qual ele responde melhor –
tem quatro filhas. Tem quatro filhas após ter vivido toda a vida com três irmãs, duas tias e a
Mãe viúva. O pai morreu quando o Avô era muito pequeno. Toda a sua vida lhe disseram que
ele tinha de ser o homem entre todas as mulheres. Estudou no Colégio Militar para ser ainda
mais homem. Campeão em esgrima e dos melhores alunos do seu ano. Seguiu para a
universidade para ser engenheiro, que era o que os homens tinham de ser. As irmãs saíram
de casa para casar. Excepto a Tia Cândida que fugiu com um inglês que conheceu nas férias
em Monte Gordo. Só se soube dela muitos anos depois, casada com o malandro e Mãe de
dois rapazes. Todas as outra irmãs, tal como o Avô, só tiveram filhas.
O Avô percebe de futebol, carros e economia. Recusa-se a cozinhar, a passar a ferro
uma camisa ou a engraxar os sapatos. Foi-lhe dito (sempre) que isso era trabalho e
obrigação das mulheres. Não deixa que se beba à mesa, a não ser que os homens também
bebam. É ele que pendura os quadros e faz as estantes, que arruma a garrafeira e que
escolhe a música que passa na aparelhagem relíquia.
O meu Avô tem quatro filhas e teve de mudar de ideias. Passou a perceber que os
homens não mandam. Que ele come o que lhe puserem no prato, que na cozinha se passam
coisas muito mais interessantes do que na sala à hora das notícias. Apercebeu-se de que a
regra, nos dias de hoje, são as mulheres como a Tia Cândida.
O meu Avô tem quatro filhas, dez netas e um único neto. E o Avô quer dizer-lhe que
o Sporting é o melhor, e ensinar-lhe esgrima, e explicar-lhe o funcionamento do melhor carro
do ano. Mas, no fundo, o Avô quer avisá-lo do perigo que são as mulheres. Que não as
subestime, que não tenha nenhuma como garantida, que as trate sempre bem.
O Avô ensinou às filhas o pouco que sabia. Ensinou-lhes respeito, a não temeram, a
serem desenrascadas, a serem fortes, astutas.
A terceira filha do meu Avô – chamemos-lhe Mãe – é a mulher mais bela que existe.
É a mulher que sei que está aqui para ajudar, para beijar, para chamar à atenção. A minha
Mãe tem 4 filhas e ensinou-nos (e ensina) tudo o que sabe: respeito, a aprender, a
amarrarmos o medo bem no fundo de cada uma de nós, a sobrevivermos, a respeitarmos, a
estarmos aqui, sempre, para todos aqueles de quem gostamos.
O meu primo é a única pessoa com a qual o Avô não sabe lidar. É, no entanto, o
único do qual o Avô tem uma fotografia na carteira dos documentos. É o homem da vida de
um grande homem.
Graças ao Avô, que tem quatro filhas, e que aprendeu a lidar com as mulheres da
vida dele, não ligando ao que os outros diziam, tenho uma Mãe fantástica. Uma Mãe que
sabe de tudo ... até de homens. Sabe mais do que o Avô.
Obrigada Vô!
Kiara Minerva
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